quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Por Um Carnaval Sem Covardia Na Fantasia


O presente tópico vem em clima e ritmo de carnaval. Numa das épocas mais festivas do ano e considerado por muitos como o maior espetáculo da Terra, os desfiles das escolas de samba costumam trazer temas que muitas das vezes remetem para o bem, para pensamentos de preservação etc e tal. Mas de que adianta falar de preservação se não se faz a preservação?

Então, o blogueiro reeditou refrões de sambas-enredo desse ano de 2013, fazendo uma brincadeira com coisa séria. Na melhor das intenções. Quem sabe, um dia, olhemos para trás e pensemos: "caramba, a gente fazia fantasia violando corpos animais?". Precisamos parar com essa cultura de exploração. Viva o carnaval com ética e respeito. No falar e no fazer.

Deus Thor me chamou, vou nessa viagem
Que felicidade, é vegan meu bem
Metade da minha fantasia é sem plumas
A outra metade é sem plumas também
(Unidos da Tijuca)

Tá na capa da revista, o meu pavilhão
E na cara dessa gente, o orgulho a emoção
Sem plumas de bicho no peito
Tem banca, moral, respeito
(Acadêmicos do Salgueiro)

Fantasia sem crueldade, é pra lá de bom
Ao som do fole, eu e você
A Vila vem plantar felicidade no amanhecer
(Unidos de Vila Isabel)

Sou coerente, meu amor
Um vencedor, meu limite é o céu
Eu vim brilhar com a Beija-Flor
Valente e guerreiro, vegano fiel
(Beija-Flor de Nilópolis)

Um animal que sente dor, sou eu
Vem cá, me dá, o que é meu, é meu
(Acadêmicos do Grande Rio)

Cai na folia sem pluma, meu bem, vem na fé
Na ilusão da fantasia
Tem consciência quem quer
(Portela)

Mangueira... o trem da emoção
Viaja na imaginação
Minha fantasia é sem pluma, matou ninguém não
É poesia que faço de coração
(Estação Primeira de Mangueira)

Onde anda você, "ararinha"?
Saudade mandou te buscar
A Ilha é vegan na avenida
Mais que nunca vou te respeitar
(União da Ilha)

Uma onda me embala, invade a alma
No peito explode a minha paixão
Um mundo melhor, que felicidade
Minha fantasia não tem crueldade
(Mocidade Independente)

No norte a estrela que vai me guiar
Exemplo pro mundo: Pará
O talismã do meu país
Sem plumas a Imperatriz
(Imperatriz Leopoldinense)

Olha quem chegou, tem caçador na mata
As aves estão fugindo desesperadas
Fantasia sem pena, por favor, minha gente
Na tela da São Clemente
(São Clemente)

Meu oriente é você
Vim mostrar o meu valor
Inocentes, as aves merecem viver
Boicote penas e plumas, amor
(Inocentes de Belford Roxo)
Exemplo de "resto de uma fantasia". Abaixo, vídeo mostrando exemplo de uma indústria de penas.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Análise Dos Sambas-Enredo Do Carnaval 2013 - Grupo Especial, Rio De Janeiro

Já virou tradição nesse blógui analisarmos os sambas-enredo das agremiações no Grupo Especial do Rio de Janeiro. Fizemos isso em 2010, em 2011, em 2012 e, pela quarta vez, estamos marcando presença para comentar as impressões a respeito de cada composição. Como esse tópico está sendo publicado antes dos ensaios técnicos na Sapucaí, não teremos vídeos como aqueles que foram vistos ano passado. De toda forma, espero que seja proveitosa a leitura.

Escola: Unidos da Tijuca
Enredo: "Desceu Num Raio, É Trovoada! O Deus Thor Pede Passagem Para Mostrar Nessa Viagem A Alemanha Encantada"
Trecho: Vai brilhar em cada cinema, um anjo sonhar / Em prosa e poema, se eternizar
Análise: O enredo é um passeio pela Alemanha, e o passeio é tão longo que pode ser considerado um mérito da escola o fato de o samba não ter ficado enfadonho. Pelo contrário. Tirando o refrão principal, que destoa pelo vazio de conteúdo, merece elogios a obra tijucana. E tudo deverá ficar ainda melhor quando se revelar cada ala e cada alegoria no desfile elaborado pelo genial Paulo Barros.

Escola: Acadêmicos do Salgueiro
Enredo: "Fama"
Trecho: Sou eu o artista, famoso sambista / Me chamo Salgueiro
Análise: É impressionante como qualquer coisa que caia nas mãos e no gogó do Quinho, dá samba. Se analisarmos friamente a letra do Salgueiro para 2013, a composição é muito abaixo da do ano passado. Mas a alegria é a mesma de sempre e dá aquela vontade de se mexer, de sambar sem parar quando se ouve essa parceria dos intérpretes com a Furiosa Bateria.

Escola: Unidos de Vila Isabel
Enredo: "A Vila Canta O Brasil Celeiro Do Mundo – Água No Feijão Que Chegou Mais Um…"
Trecho: Agradeço a Deus por ver o dia raiar / O sino da igrejinha vem anunciar
Análise: A Vila está se mostrando especialista em fazer samba que concilia poesia e empolgação. No meu entendimento, é isso o que se espera de um bom samba-enredo. Essa é a segunda ou terceira vez nos últimos quatro anos que vejo na escola de Noel Rosa a melhor composição da safra. Salve, Martinho! Parabéns, Tinga!

Escola: Beija-Flor
Enredo: "Amigo Fiel – Do Cavalo Do Amanhecer Ao Mangalarga Marchador"
Trecho: Eu vou cavalgar pra encontrar / A minha história nesse mundo de meu Deus
Análise: É a Era dos patrocínios. Exploradores de equinos derramaram dinheiro em Nilópolis e a escola resolveu falar sobre o "puro sangue". Estivéssemos no século dezenove, grandes seriam as possibilidades de algum grêmio recreativo escola de samba se prestar a promover a escravidão de pretos para honrar as verbas injetadas pelos senhores de engenho. E Neguinho, de tão "profissional", se prestaria a cantar. E sabe o que mais? Muitos sambariam...

Escola: Acadêmicos do Grande Rio
Enredo: "Amo O Rio E Vou À Luta: Ouro Negro Sem Disputa"
Trecho: Um Grande Rio de amor, sou eu / Vem cá, me dá, o que é meu, é meu
Análise: É a Era dos patrocínios... A Grande Rio, que "surgiu" como uma escola que dava um banho de cultura, passou a ser uma captadora de recursos sem critérios. Dessa vez, foram os royalties do petróleo que seduziram a agremiação caxiense. O pior não é nem isso: a letra é medonha e há inclusive comentários levianos sobre a extração do combustível fóssil. Levianos para não dizer falaciosos. A palavra "preservar" deveria ser proibida de ser colocada em vão. Fico eu aqui imaginando se Nêgo, que retornou à tricolor, não sente saudades daqueles tempos em os enredos da Grande Rio eram escolhidos com menos influência financeira do que filosófica.

Escola: Portela
Enredo: "Madureira… Onde O Meu Coração Se Deixou Levar"
Trecho: Cai na folia comigo, meu bem, vem na fé
Análise: O samba portelense desse ano me lembra muito o do ano passado. Gilsinho seguiu a mesma linha melódica de 2012 e, novamente, a escola virá com uma composição gostosa de se cantar. Dessa vez, o apelo aos torcedores da escola é maior, pois o enredo conta a história do bairro de Madureira. Ninguém me perguntou nada, mas preferi o samba do ano passado.

Escola: Estação Primeira de Mangueira
Enredo: "Cuiabá, Um Paraíso No Centro Da América"
Trecho: Meu samba é madeira, é Jequitibá / É poesia dedicada a Cuiabá
Análise: Achei interessante o fato de as rimas mangueirenses serem verso-a-verso, praticamente na totalidade da letra. Isso não é receita de sucesso, mas quando a melodia ajuda, facilita demais para o samba cair na boca do povo. E essa é a impressão que tenho: será um dos sambas mais cantados em 2013. Com as bênçãos da Surdo Um.

Escola: União da Ilha do Governador
Enredo: "Vinícius, No Plural. Paixão, Poesia E Carnaval"
Trecho: Onde anda você, "Poetinha"? / Saudade mandou te buscar
Análise: Não apenas gostei - e muito - do samba da Ilha como achei esse trecho acima um dos mais belos feitos nos últimos anos. É simples e profundo, direto e reflexivo. Ito Melodia, mais uma vez, acertou no tom. Na Era dos patrocínios, há que se valorizar um enredo autoral homenageando um "imortal". Dinheiro nenhum compra isso.

Escola: Mocidade Independente
Enredo: "Eu Vou De Mocidade Com Samba E Rock In Rio – Por Um Mundo Melhor"
Trecho: Um mundo melhor… que felicidade / No Rock in Rio eu vou de Mocidade
Análise: Sou suspeito pra falar de samba da Mocidade pois não sei precisamente onde fica a fronteira entre o analista e o apaixonado. E, somando-se a isso o fato de ser um apreciador do festival denominado Rock In Rio, o melhor a fazer seria ficar calado dada tamanha parcialidade. Mas há pelo menos duas coisas que não posso deixar de dizer. A primeira é que não achei um grande samba e muito disso se deve às limitações que o próprio enredo impõe. A segunda é que, apesar disso, acho que há grandes chances de o samba puxado pelo Luizinho Andanças casar com o desfile preparado pelo Alexandre Louzada. De toda forma, nada que possa se comparar com a poesia que se fez ao Portinari no carnaval passado.

Escola: Imperatriz Leopoldinense
Enredo: "Pará, O Muiraquitã Do Brasil"
Trecho: Oh! Mãe… Mesmo se um dia a força me faltar, / A luz que emana desse teu olhar / Vai me abençoar
Análise: Muito legal ver um samba nas vozes de Dominguinhos e Wander. E o samba da Imperatriz tem muito a cara deles, principalmente do Dominguinhos. Não sei como será o funcionamento disso na avenida, mas torço para que seja o melhor possível. O refrão principal me parece um pouco problemático no sentido de que pouco passa de mensagem. Mas o trecho que o antecede é de tamanha beleza que talvez consiga amenizar um eventual estrago.

Escola: São Clemente
Enredo: "Horário Nobre"
Trecho: Nem adianta me ligar agora / Eu estou grudado na tela
Análise: Tem a irreverência característica da São Clemente. Ano passado, o "bububu no bobobó" funcionou bem na Sapucaí, ajudando a agitar componentes e arquibancadas. Resta saber se, em 2013, nessa apologia noveleira, o resultado poderá ser semelhante. A letra não me agrada, mas em meio a uma safra tão fraquinha, esse samba está longe dos piores do ano.

Escola: Inocentes
Enredo: "As Sete Confluências Do Rio Han – 50 Anos Da Imigração Sul-coreana No Brasil"
Trecho: Coréia do Sul, suas águas cristalinas são o espelho / Na cadência da Baixada / Deságuam no meu Rio de Janeiro
Análise: Estreante no Grupo Especial, a Inocentes traz um samba com cara de Grupo de Acesso. Mas isso não é problema para quem tem um gogó como o do Wantuir puxando o samba da escola. A melodia até flui bem, mas sinto a falta de um suingue daqueles que ajudem a bateria a brincar um pouco na avenida. O trecho que antecede o refrão principal me parece o ponto alto da obra belford-roxense.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Que Democracia É Essa?

No Brasil, o voto é obrigatório. Chamam isso de "festa da democracia". Não é um direito, uma opção, uma escolha. É um dever.

As eleições acontecem nos anos pares, sendo realizadas no primeiro domingo de outubro (primeiro turno) e no último domingo do mesmo mês (segundo turno, quando necessário).

No dia primeiro de janeiro do ano seguinte, isto é, cerca de três meses depois do certame eleitoral, acontece a posse dos "escolhidos". Entre aspas porque nem sempre estes são os mais votados - existe um tal de coeficiente eleitoral no meio do caminho entre o eleitor e a urna eletrônica.

De toda forma, na suposta festa da suposta democracia, agendada para o primeiro dia do ano ímpar (caso de 2013), eis que são barrados na porta da Câmara Municipal... os eleitores! Sim, aqueles mesmos que eram saudados calorosamente pelos então candidatos, agora são figuras dispensáveis.

Quando um segurança pergunta para você se você vai "se manifestar ou assistir" para impedir ou liberar o acesso, como se fosse uma senha-não-secreta, estamos falando em democracia? Quem, num ambiente democrático, tem o poder ou mesmo o direito de proibir um cidadão de bem a assistir (ou se manifestar, por que não?) a cerimônia dos recém-empossados?

Se todo poder emana do povo e é o povo aquele que não tem acesso ao ambiente onde são tomadas as decisões, então não estamos falando do mesmo regime de governo. E talvez pior do que tiranos, déspotas e ditadores, que têm rosto, nome e sobrenome, é essa alguma coisa em que vivemos. Essa tem vários semblantes, diversas facetas e recebe o nome de democracia. Deve ser nome de fantasia.

No Rio de Janeiro, a militância em defesa da Aldeia Maracanã (antigo Museu do Índio), reivindica o tombamento de um prédio histórico a fim de preservar a manifestação legítima da cultura indigenista naquele território. O governador Sérgio Cabral Filho (PMDB), o prefeito Eduardo Paes (PMDB) e aquilo que vem se chamando de "base aliada" (maioria da bancada na Câmara de Vereadores) prefere a idéia de transformar o local em estacionamento. Algo absolutamente contrário ao interesse da população e que afronta qualquer bom senso. Argumenta-se que a demolição do prédio será para atender recomendações da FIFA para a Copa do Mundo 2014. Acontece que a própria FIFA desmentiu essa informação, afirmando ser favorável à manutenção daquele espaço como centro cultural indígena. Alguém mente nessa história. E o povo, na festa da democracia, parece não ter direito a voz. Voz. Porque o voto, esse não é um direito. Esse é um dever.