terça-feira, 26 de outubro de 2010

Voto Derradeiro Nas Eleições 2010: O Que Fazer?

Tão logo foi oficialmente divulgado o segundo turno presidencial entre Dilma Rousseff (para mais 4 anos de PT) e José Serra (para mais 4 anos de PSDB), notei que me encontraria em um grande dilema para o novo pleito eleitoral.

A votação derradeira acontecerá no próximo domingo, 31. A dúvida que paira sobre esta mente é se devo anular o voto teclando 50 (ou qualquer outro número que não o dos candidatos, embora o 50 carregue um aspecto simbólico) ou se devo anular o candidato José Serra teclando 13.

A candidata Dilma não me empolga. Votar nela seria, no meu raciocínio, votar na plataforma petista, que, embora não seja a ideal, é muito mais próxima dos menos favorecidos do que a plataforma tucana, altamente elitista no seu mergulho neoliberal.

Mais que isso, votar em Dilma seria o ato formal de comprovar o meu medo no retorno dos tucanos ao governo federal. As gestões de FHC (nas quais José Serra foi ministro da Saúde e também ministro do Planejamento) representaram oito anos que eu não gostaria de ver o Brasil experienciar de novo.

No debate de ontem, anunciado como o penúltimo da televisão, ficou bastante claro uma coisa: tanto Dilma quanto Serra estavam mais preparados em apontar os podres dos oponentes do que propriamente a apresentar uma política pública que contemple a massa de necessitados.

Num determinado momento, foi feita uma pergunta ao tucano que comparava os 8 anos de governo do PSDB (5 milhões de empregos gerados) com os quase 8 anos de governo do PT (cerca de 15 milhões de empregos gerados). O tucano "preferiu" falar da Petrobras, numa explanação que não contemplou palavras como "emprego", "trabalho", "renda", supostamente no mesmo campo semântico da pergunta a ele feita. Daí eu pergunto: houve um debate? Dou-me a liberdade de responder: não, não houve. Talvez tenha havido um conflito. Mas, infelizmente, não um conflito de idéias - por mais incrível que possa parecer, os dois candidatos em muito se assemelham - e sim um conflito na esfera pessoal. Para tristeza dos eleitores, obrigados a comparecerem a uma zona eleitoral e depositar seu voto numa específica urna eletrônica, sobraram duas coligações de mensaleiros. Não há moral de nenhum sobre outro ali. Ambos, quietos, já estariam errados. Mas eles fazem questão de falar. Debater que é bom, quase nada.

Bem, talvez você esteja querendo saber para quem vai o meu voto. Devo confessar que tenho mais medo de um novo governo tucano do que empolgação por um novo governo petista. 8 anos atrás, fui votar pela primeira vez. 16 anos de idade (ou 17 recém-completados, não lembro) e um sentimento de esperança personificado na figura barbuda e carismática de Luís Inácio "Lula" da Silva. Lula foi eleito, e a política privatizatória de Fernando Henrique desfeita (dou graças a Deus por isso). Os indicadores sociais deram saltos. O Brasil melhorou. Mas vieram escândalos, alguns deles lamentáveis, principalmente por envolver um partido que enchia a boca para falar de "ética". Em 2006, dei meu voto no primeiro turno para Heloísa Helena. No segundo, para Lula. Nesse ano, votei em Plínio de Arruda Sampaio, um indivíduo que chegou a me comover com a sua linda candidatura. No segundo turno, o que fazer? Retornando ao sentimento de esperança - campanha "a esperança venceu o medo" -, a minha única esperança nesse segundo turno é de conotação utópica: de que o povo brasileiro anulasse o voto. Votar em Dilma seria motivado pelo sentimento de medo: medo de uma eleição de José Serra. Não posso trair um sentimento tão nobre quanto o da esperança. Por mais utópico que pareça. Tá decidido: vou anular.

Bom voto para todos. O país que merecemos é esse que está aí. Nada mais que isso.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Uma Unidade Resgatada

70 dias. O que você faz em 70 dias?

São 10 semanas. Mergulhados na rotina cotidiana, nem nos damos conta do que podemos fazer nesse período. No Chile, trabalhadores de uma mina ficaram soterrados e conviveram por 70 dias privados de toda comodidade, sem poder sequer ver a luz do sol. Surpreendentemente, aquelas 33 pessoas (leia-se 33 heróis) conviveram harmoniosamente, esbanjando inclusive bom-humor.

Não sei o que esse fato marcante possa ter representado para você que está lendo essas palavras nesse momento. Mas, para mim, foi bastante significativo. Uma verdadeira aula de valorização da vida. Uma volta por cima - literalmente - inspiradora. A mobilização internacional para acompanhar o resgate também é um sinal positivo. Eu, se fosse cineasta, correria atrás dos direitos de transformar essa história em filme. Não sou, então dedico, humildemente, essa postagem a cada um dos 33 indivíduos que tanto ensinaram àqueles dispostos a extrair algum aprendizado dessas situações inusitadas que a vida por vezes pode nos proporcionar.

Mais que uma unidade de mineiros, creio que a humanidade pode ter sido resgatada. Um resgate de valores. Viva a vida!

Juan Carlos Aguilar, um dos mineiros resgatados, retorna à mina para acompanhar uma missa de agradecimento, acompanhado de esposa e filha.

Que os próximos 70 dias sejam muito bons para todos nós!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

14:53h, 28ºC

O relógio digital situado no estádio Jornalista Mário Filho, vulgo Maracanã, apontava esse horário e essa temperatura. Enquanto isso, lá estávamos Gaia, Samadhi e eu a andar em torno do "maior do mundo" (hoje um canteiro de obras gigantesco). Ao fato.

Num determinado momento, as cadelas começaram a tentar me puxar pro lado. Era exatamente na direção onde passava um sujeito andando com um copo de sorvete. Trouxe as coleiras mais pra perto e seguimos em frente.

Eis que o camarada olha pra elas e, de alguma forma, toma a iniciativa de oferecer-lhes um pouco de sorvete! Nunca havia visto isso antes, ainda mais na rua, sem "conhecer" a pessoa. Acha que acabou? Está apenas começando...

Ele: aê, elas podem tomar um pouco desse sorvete? Eu abaixo o copo...
Eu: pô, acho melhor não, é capaz delas avançarem...
Ele: ah! Então eu coloco um pouco aqui [apontando pro chão] pra elas.
Eu: beleza, cara!

Nesse momento, o sujeito pega uma colherada generosa de sorvete, se abaixa e sacode a colher generosamente para que o sorvete caísse no chão. E lá foi a Samadhi devorar, sem deixar nada pra Gaia.

Ele: a outra não tomou, vou botar mais.
Eu: demorô.

Nesse momento, segurei a Samadhi e lá foi a Gaia abocanhar o sorvete.

Eu: ó a alegria delas...
Ele: se amarram, né?
Eu: pô, valeu aí...
Ele: valeu!

E lá foi ele andando, tomando o resto do sorvete, gentil e espontaneamente compartilhado.

Nunca vi nada dessa natureza antes. Coisas assim, aparentemente banais, me fazem ter esperança na espécie humana, mesmo diante de uma sociedade que nos enche de motivos para temermos o futuro que se aproxima. Isso faz diferença.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Festival De Cinema Do Rio

Do dia 23 de setembro até hoje, cariocas e/ou viajantes que encontram-se na Cidade Maravilhosa puderam curtir o Festival de Cinema do Rio de Janeiro. Não me considero um cinéfilo (esse termo me sugere algo como "sujeito alucinado por cinema", creio que esteja num estágio pouco mais são que esse) mas o fato é que consegui ver vários filmes. De segunda-feira até ontem foram 4 (sendo um de fora do Festival). Vamos a alguns pitacos.

Comer, Rezar, Amar

É, esse não era pelo Festival (estava sendo exibido no circuito comercial). O filme tem várias paradas com as quais me identifico: aborda a Itália, a Índia, futebol, devoção, vegetarianismo, espiritualidade, trilhazinha sonora brasileira. E tem a Júlia Roberts, né? De toda forma, achei o olhar demasiado hollywoodiano (leia-se superficial). O início do filme parece fragmentado, meio que sem sentido, mas aos poucos a história vai ficando interessante. A atuação de Júlia é convincente (pra variar) e, mesmo com o tanto de estereótipos toscos (por acaso é comum no Brasil o pai beijar o filho na boca?), vale dar uma olhada. Pra quem não sabe, esse filme deu bastante polêmica entre os torcedores da Lazio: no livro que deu origem à obra audiovisual o personagem torcia pelo clube da camisa celeste, enquanto na película o cara "virou" torcedor da Roma. Roma, justamente a maior rival da Lazio. Alguns adeptos mais exaltados sugeriram o seguinte: "coma, reze, ame, leia o livro, mas não vá ao cinema". Eu, teimoso, acabei indo. Não empolgou, mas achei que valeu. Detalhe: meiaentrada segunda-feira por R$3,50 é o que há!

José Martí: O Olho Do Canário

Inspirador! História bem contada, que flui bem, se desenrola com coerência. O diretor conseguiu adentrar no drama dos personagens de uma forma muito sensível e contar a história de um dos pilares da Revolução Cubana. Confesso que pouco - quase nada - sabia a respeito da opressão espanhola sob o povo da ilha da América Central, e a biografia de José Julián Martí Pérez me comoveu. O desfecho da história com uma das poesias de José Martí associada à imagem da cena foi absolutamente memorável. "Viva Cuba libre"! Viver por um ideal, pense nisso.

Poesia

Filme coreano que retrata a vida de uma senhora humilde, empregada doméstica e que cuida do neto sozinha. A história, ao meu ver, carece de um clímax, mas é de alta sensibilidade. A relação da senhora com o Alzheimer, a vida do neto, o trabalho que lhe dá sustento e a poesia tecem uma trama cheia de mensagens sutis. Me lembrou um pouco o filme "Mother". Esse seria o "Grandmother". Grandiosa é a atuação da atriz Yun-Jung Hee.

Lope

Na cerimônia de encerramento do Festival de Cinema do Rio, muita badalação no Cinema Odeon. Lá estava eu, quase que de penetra, sendo cumprimentado por alguns "famosos" que deveriam achar que eu também tô no ramo haha... Falando do filme, pode-se dizer que a obra cresce. Cresce absurdamente, a ponto de parecer que trata-se de uma co-produção onde os primeiros enfadonhos minutos foram de autoria de algum amador da indústria cinematográfica e, a partir de um certo momento, a obra ganha vida e toma ares de um filmaço. Recomendo que assista e dou a dica: não saia antes de terminar. Mais um daqueles filmes com um final para se guardar na memória.

Também assisti o filme israelense "O Errante" (semana passada). Esse daí achei de uma genialidade sinistra. Tão genial que foi mal compreendido pelo público. Justifica-se: quadros mal encaixados (certamente propositalmente, talvez para causar desconforto), 0 de trilha sonora (a vida real também não tem musiquinha de fundo, senhoras e senhores), seqüências demoradas de cenas (pela primeira vez pude ver um ovo ser fritado na grande tela). A realidade perturbadora do protagonista é tratada de forma seca, mostrando que o diretor Avishai Sivan veio não para ser mais um, mas para deixar a sua marca. Em tempos onde o cinema-entretenimento trás cenas em ritmo alucinante e tirando do espectador a mera possibilidade de "pensar o filme", O Errante está aí. Vá preparado para algo que escapa do comum. Ou então, nem vá.

O Errante: pessoas acostumadas com o "jeito Hollywood de ser" terão dificuldades de encarar o filme israelense.

Antes ou depois de "O Errante" (desculpem, não lembro mesmo), assisti ao filme "A Última Estação", que conta a biografia de Liev Tolstói. Como não poderia deixar de ser, o filme tem significativo viés filosófico, apoiado na mente iluminada daquele russo, que optou por um modo de vida baseado no voto de pobreza, no vegetarianismo e na castidade. É agradável o fluir do filme, mas senti que a história de Tolstói "não coube" na película de 112 minutos. Merece uma trilogia. E, se possível, com a mesma equipe que participou dessa obra.

A Última Estação: Christopher Plummer parece a própria encarnação de Tolstoi, em filme com sabor de quero mais.