quinta-feira, 29 de julho de 2010

Olé Na Violência, Golaço Da Ética

Havia comentado, mesmo que indiretamente, sobre a questão das touradas (tópico Civilização E Barbárie). Ontem, 28 de julho, o Parlamento da Catalunha deu uma grande notícia para a província espanhola e para o planeta como um todo: a tradicionalíssima prática que coloca os touros a mercê de lanças perfurantes será proibida a partir de janeiro de 2012 (ver matéria da BBC Brasil).
"Arte tauromáquica" ou simplesmente "tortura"? Depende da vítima, depende do agressor...

Não devemos subestimar o grande avanço que é esse que está acontecendo em território espanhol. Além dessa vitória dos direitos animais incentivar que a medida seja implementada ou pelo menos debatida em outras localidades, está mostrado ao mundo que é perfeitamente possível - e viável - revermos os valores herdados por incontáveis gerações e que perpetuamos cotidianamente sem sequer questionarmos as razões de aquilo seguir acontecendo. Um homem perfurar um touro, enlaçar um bezerro ou qualquer coisa equivalente, para o gozo inoportuno da multidão que assiste delirante, é certamente um ponto a ser observado para a construção de uma moral que pede para emergir em meio ao caos. Sermos cúmplices dessas práticas não é, definitivamente, eticamente aceitável. Felizmente, uma petição assinada por cerca de 180 mil pessoas rendeu bons frutos na Catalunha. Que sirva de exemplo!

Em tempo e em memória de José Saramago, transcrevo novamente suas sábias palavras com relação às touradas espanholas, texto que ele colocou sob o título de "Espanha Negra".
Refiro-me a essas vilas e cidades onde, por subscrição pública ou com apoio material das câmaras municipais, se adquirem touros à ganaderias para gozo e desfrute da população por ocasião das festas populares. (...) Coberto de sangue, atravessado de lado e lado por lanças, talvez queimado pelas bandarilhas de fogo que no século XVIII se usaram em Portugal, empurrado para o mar para nele perecer afogado, o touro será torturado até à morte. As criancinhas ao colo das mães batem palmas, os maridos, excitados, apalpam as excitadas esposas e, calhando, alguma que não o seja, o povo é feliz enquanto o touro tenta fugir aos seus verdugos deixando atrás de si regueiros de sangue. É atroz, é cruel, é obsceno. Mas isso que importa se Cristiano Ronaldo vai jogar pelo Real Madrid? Que importa isso num momento em que o mundo inteiro chora a morte de Michael Jackson? Que importa que uma cidade faça da tortura premeditada de um animal indefenso uma festa colectiva que se repetirá, implacável, no ano seguinte? É isto cultura? É isto civilização? Ou será antes barbárie?
Descanse em paz, filósofo! As coisas estão se acertando!

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