Bom, façamos de conta que no progresso social não há desigualdade, que no progresso científico a ética é priorizada e, pra não irmos muito longe, que a geopolítica mundial encontra-se direcionada ao bem-estar e à prosperidade da humanidade. Feito o faz-de-conta, vamos agora colocar a premissa: somos civilizados. Conseguimos engolir essa? Então agora, deitados eternamente no berço esplêndido de uma cultura triunfante, isenta de erros, vamos apontar os dedos para as culturas alheias e, se não concordarmos, vamos rotulá-los de bárbaros. Que tal?
É mais ou menos o que fazemos com relação ao Oriente Médio. A imagem a seguir mostra uma cena de execução por apedrejamento, pena aplicada em alguns países asiáticos.
A violência extremada na pena de morte por apedrejamento leva muitos ocidentais a reprovarem veementemente essa prática. Os civilizados do Ocidente aplicam outras punições aos infratores, como o enclausuramento nos sistemas prisionais, ou a pena de morte "indolor" via injeção letal, ou mesmo o enforcamento, que, salvo algum contratempo, desfalecerá a vítima em poucos minutos. O recado do Ocidente para os "médio-orientais" seria uma espécie de: aprendam a matar como matamos. Que moral, né não?
É interessante porque nesse mesmo Ocidente - e agora falando um pouco do Brasil - há várias práticas, legitimadas pela noção de cultura, que levam seres sensíveis a experimentarem dor e sofrimento. É o exemplo dos rodeios. Como seria possível dar razão à exploração dos animais usados nas arenas baseado numa opção cultural?
Ora, se a cultura dá sustentáculo a essa atrocidade, por extensão, também dará a qualquer outra. Posicionar-se a favor ou contra esse tipo de "espetáculo" deve transcender qualquer viés cultural, alicerçando-se tão somente na ética. É correto atentar contra a liberdade de alguém e mantê-lo sob exploração porque uma determinada cultura convencionou que isso é aceitável?
São muitos os exemplos que aqui caberiam para desconstruir essa fictícia noção de civilização, que torna dos pseudo-civilizados criaturas acomodadas na repetição de hábitos anti-éticos, convenientemente assentados na definição de cultura.
Encerro essa postagem com as palavras de José Saramago, que sintetizam com primor o que aqui é exposto. O título é "Espanha Negra", ilustrando o caso das touradas que acontecem naquele país.
Refiro-me a essas vilas e cidades onde, por subscrição pública ou com apoio material das câmaras municipais, se adquirem touros à ganaderias para gozo e desfrute da população por ocasião das festas populares. (...) Coberto de sangue, atravessado de lado e lado por lanças, talvez queimado pelas bandarilhas de fogo que no século XVIII se usaram em Portugal, empurrado para o mar para nele perecer afogado, o touro será torturado até à morte. As criancinhas ao colo das mães batem palmas, os maridos, excitados, apalpam as excitadas esposas e, calhando, alguma que não o seja, o povo é feliz enquanto o touro tenta fugir aos seus verdugos deixando atrás de si regueiros de sangue. É atroz, é cruel, é obsceno. Mas isso que importa se Cristiano Ronaldo vai jogar pelo Real Madrid? Que importa isso num momento em que o mundo inteiro chora a morte de Michael Jackson? Que importa que uma cidade faça da tortura premeditada de um animal indefenso uma festa colectiva que se repetirá, implacável, no ano seguinte? É isto cultura? É isto civilização? Ou será antes barbárie?
(bastante útil: http://ddapelotas.blogspot.com/2008/10/cultura-cultura-aqui-e-no-oriente-mdio.html)
coé, du..mto bom o texto..vc manda benzasso escrevendoooo!!
ResponderExcluirÉ horrível perceber que "seres humanos" submetem-se à terríveis culturas, e saber ainda que são pessoas! Pessoas que evoluíram junto com os animais, mas que por razão da sua burrice se acham superiores a esses seres.
ResponderExcluirE pensar que essas pessoas fazem parte da minha raça me dá nojo!
seres horríveis e cruéis que é o tal do ser humano que se diverte com a desgraça dos animais indi guinação total até quando isso vai durar....
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